Rota Jurídica
O impacto do PL das Fake News na Sociedade
Prof. Dr. Álvaro Machado Dias fala sobre os impactos do PL 2630/20, conhecido como Projeto de Lei das Fake News na vida das pessoas e no dia a dia da mídia.
Quais são os principais pontos do projeto das fake news e como ele pode afetar as Big Techs e o público em geral?
Entre os principais pontos estão a prisão de quem disseminar fake news a partir de estratégias de disparos em massa; o tratamento idêntico para redes sociais e aplicativos de mensagem de largo uso, como o WhatsApp e o Telegram, que deverão ter um representante legal no país e, de maneira conjunta, criar um órgão autorregulatório. E a responsabilização das plataformas pela atividade continuada de bots de comunicação que, neste sentido, precisam ser derrubados assim que sua atividade incomum for identificada.
Porém, nada disso que vem causando tanta controvérsia quanto a remuneração obrigatória dos produtores de conteúdo, como jornais e revistas, pelo material indexado por redes sociais e serviços de notícias dos buscadores, tipo o Google News. Para o público geral, a repercussão pode ser enorme, dado o risco de redução de fontes de informação disponíveis via browsers e redes sociais.
Temos lido que as Big Techs estão resistentes às obrigações mantidas pelo projeto de Lei. Existe algum tipo de risco para elas com a aprovação do projeto?
Existem riscos, o que do ponto de vista de negócios significa custos, mas eles não são tão grandes quanto anda-se dizendo. Por exemplo, o Telegram, que ainda não tem um representante legal no país, terá que nomear alguém, o que é muito diferente da necessidade de ter sede no país – algo que, se aprovado, teria sido danoso para o nosso ecossistema tecnológico.
No mesmo sentido, a criação de um órgão autorregulatório em solo nacional já faz parte do pipeline das principais empresas de tecnologia digital, o que também se estende à necessidade de supervisionar as redes, para identificar e derrubar os bots que espalham fake news. Corroborando a máxima de que a falcatrua sempre anda passos à frente da lei, a disseminação de fake news vem sendo exercida mais por usuários reais do que por bots, em contraste com o que se dava até recentemente. A novidade está no aumento da sutilezas na apresentação dessas informações. Mais sobre isso, aqui.
O senhor acredita que as Big Techs irão se adequar às obrigações?
Não tenho dúvida disso, até porque não é vantajoso agir ao arrepio da lei – especialmente quando se tem o governo federal como cliente e fiador. De todo modo, não acredito que a discussão vá nessa direção, mas sim na do repasse dos passivos da lei para o consumidor que, neste caso específico, está com seus interesses principais alinhados ao das Big Techs.
O projeto das fake news poderá revolucionar a era digital na qual vivemos – onde milhares de informações circulam em diversos veículos diferentes – estabelecendo um maior controle do que pode ou não ser divulgado?
Não acredito que possua o potencial de revolucionar a circulação de informações. O que espero é que, de um lado, ajude a refinar nossa relação com a chamada verdade factual, aqui definida como o ponto médio ao qual convergem as fontes de informação de maior reputação, independentemente de sua orientação política; e, de outro, que empobreça os fluxos discursivo-informacionais, em função do lobby da indústria jornalística tradicional.
O senhor acredita que a aprovação da lei será positiva, tendo em vista a necessidade de combate às fake news?
Apesar da importância imensa do combate às fake news, a aprovação da lei tende a ser mais negativa do que positiva para o consumidor, dado que a cobrança das empresas de tecnologia pela indexação de fontes de notícias deverá empobrecer demais o ambiente informacional, matando os pequenos, com os quais as Big Techs não terão tempo ou interesse em negociar o estabelecimento de parcerias de conteúdo. A experiência europeia deveria servir de exemplo do que não fazer neste caso, em contraste com tantos outros em que serve de exemplo de alinhamento ao melhor interesse do consumidor.